terça-feira, 27 de março de 2012

O MESTRE ENTRE ALUNOS - Projeto InterFace


Visita à Casa Mandicuera                                         texto e fotos: Silzi Mossato

Mestre Zeca afinava, de ouvido, os instrumento que os alunos usariam na aula que daria à seguir. Acostumado às visitas, nos recebeu com gentileza, sem deixar a ativadade. Com rapidez e agilidade passava da viola à rabeca e a outra viola e outra rabeca. E enquanto cumpria o ritual, nos mostrou, com os mesmos movimentos leves e sutis, a habilidade com um e outro instrumento. Entrecortando o som, com a fala impregnada de alegria sincera, contou sua trajetória de fandangueiro.
Mestre Zeca é, no momento, o último rabequista da Ilha dos Valadares, em Paranaguá. Os velhos mestres partiram sem deixar seguidores. Mas a Casa Mandicuera cuida para que a arte não desapareça e recebe um grupo de alunos que nas tardes de sábado deixam a cidade vizinha para ter aulas de viola e rabeca.
Na Ilha há outros grupos de Fandango: Grupo do Mestre Romão, Grupo do Mestre Brasilio e Grupo Pé de Ouro. Mestre Zeca toca em todos. E com riso esboçado, confessou que este ano, no carnaval da Ilha, que foi de fandango. tocou quatro bailes, das dez da noite às quatro da manhã, mas cansou. Os grupos se revesavam, mas ele, integrante de todos, não teve tempo pro descanso.
José Martins Filho tem cinquenta e nove anos, vive na comunidade há trinta e toca rabeca desde os catorze. A música limpa, simples e bela, sai do instrumento sem que se possa ver no tocador, qualquer sinal de esforço.
Ao lado de Jairo Paulo, vocalista de primeira voz no Grupo Mandiquera, nos presenteou com alguns clássicos, antes que os alunos chegassem.


OS ALUNOS DO MESTRE
Luis Fabiano Corujinha, João Batista de Andrade e Maria Eduarda moram em Morretes. No momento fundam um novo grupo de fandango e fazem aula com Mestre Zeca para que outros possam dançar ao som de seus instrumentos. No sábado de nossa visita trouxeram um visitante, Luiz Fernandes, dançarino de fandango, para que pudesse viver a experiência.
Luis Fabiano escolheu a rabeca como instrumento enquanto João Batista e Maria Eduarda seguem na viola. Ela, dando mobilidade à tradição, será a primeira violeira de fandango.
A prefeitura de Paranaguá, entendendo a valor da proposta, a apoia, remunerando o mestre, que sempre viveu de outros trabalhos.
A aula simplesmente acontece. Mestre Zeca na rabeca ordena, sem ditar regras, uma sequencia de atos, dando atenção a um e outro. Os olhos brilham, enquanto faz movimentos com o arco e, ao mesmo tempo, cuida dos detalhes dos movimentos de seus alunos. .

O PRÓXIMO APRENDIZ
André Bello é aprendiz no Atielier Rodrigo Domingues, oficina da Casa Mandicuera, onde o fabriqueiro Aorélio Domingues, produz e repassa sua arte. André nos conta que já construiu seis rabecas, mas vendeu. Agora constrói a sua. Tomará aulas com mestre Zeca, mas desde já, com instrumento coletivo, ensaia os movimentos e tira das cordas, os sons do fandango.

Desta maneira, na simplicidade das ações, os integrantes da Casa Mandicuera repassam e dão mobilidade à tradição, prestando um serviço essencial à nossa identidade cultural.


Projeto InterFace:
OSS e Kaaru Ara
elaboração e execução: Erly Ricci e Silzi Mossato




segunda-feira, 19 de março de 2012

LISISTRATA - Sedução e poder, no FRINGE


Representada no ano de 411 A.C., a peça de Aristófane, Lisistrata,  foi uma tentativa real de acabar com uma guerra de verdade. No palco, mulheres de Atenas, de Esparta, de Beócia e de Corinto (cidades gregas mais duramente atingidas),  cansadas da guerra e e chefiadas por Lisistrata decidem pôr fim às hostilidades usando de uma tática pouco ortodoxa: UMA GREVE DE SEXO.
Infelizmente a mensagem de Aristófanes não foi ouvida e a guerra continuou, arruinando a Grécia. Mas Lisistrata atravessou vinte e quatro séculos. A mais licenciosa das comédias de Aristófanes, pela elevação dos sentimentos que animam a heroína, pela nobreza das intenções do comediógrafo e por suas próprias qualidades como teatro, merece o lugar que ocupa no cenário mundial.
Lisitrata percorreu séculos mantendo-se o brilho da comédia e a espiritualidade que mal se dissimula por trás da crueza do argumento. 

Durante o Festival de Teatro de Curitiba,nos dias 05, 06 e 07 de abril,   os aficionados da arte poderão ver a montagem realizada pela Ferrata Produções em parceria com a OSS, no Centro Feminino de Cultura do Paraná.


quinta-feira, 8 de março de 2012

Escola de sexo para homens – uma dramaturgia invulgar


Folder do espetáculo "Escola de sexo para homens"
Folder do espetáculo "Escola de sexo para homens"
Escola de Sexo para Homens é um texto de dramaturgia que trata de sexo sem apelações baratas. Não vulgariza e nem teoriza as relações de gênero.
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O texto lança nova dramaturga. Ao escolher um texto provocativo, que transita entre o riso e a emoção, a autora traz à superfície os jogos das relações de gênero, costumeiramente carregados de atalhos e dissimulações. Ultrapassando a fronteira da “mulher vitima” versus “homem vitimador” ou da “mulher liberada” versus “homem convencional” e mergulhando na complexidade das interações, insere na pauta da dramaturgia novo enfoque para o antigo tema. O texto permite que os atores contracenem com a platéia, questionando os ‘lugares comuns” das relações de gênero, sem, contudo, teorizar a respeito.
Um projeto de montagem foi aprovado pela Lei Rouanet e a autora , Maria Silzi Mossato, disponibilizou um trecho no seu blog, “Lá vem Maria”.
SINOPSE:
No palco, Beatriz, Marli e Julia, três mulheres que habitam três universos aparentemente paralelos são biografadas e, ao mesmo tempo, se desvelam através de pequenos monólogos entrelaçados. Dois atores, lançando mão de adereços e de muitos personagens, marcam a heterogeneidade do universo masculino, geralmente relegado ao segundo plano. Em suas interferências, lançam aos expectadores, versões que podem desarticular as verdades quase incontestáveis, difundidas pelas personagens. Este jogo cênico, de caráter dialético e bem humorado, percorre três atos que avançam na complexidade.
No primeiro ato apenas Beatriz e Marli ocupam o palco. A protagonista (Beatriz), usando como mote as relações pessoais e sexuais, traça o perfil da segunda personagem ao mesmo tempo em que se desnuda. Marli, atendendo às propriedades de seu rígido perfil, se revela através de suas opiniões e em cenas cotidianas, sem ater-se a outros universos.
No segundo ato a presença de Marli é suprimida ao mesmo tempo em que Julia ocupa o espaço cênico, representando um terceiro nicho feminino. A personagem, além de complementar e redirecionar o retrato imposto por Beatriz, trás em seu discurso as questões sociais que interferem na sua realização pessoal.
O ato inicia com uma interferência masculina, que depois de biografar Beatriz – a representante do universo das empreendedoras liberadas – reaparece, pontuando o outro lado das versões femininas.
As interferências masculinas crescem no terceiro ato, em forma de depoimentos. Personagens masculinos e Beatriz se alternam, construindo uma seqüência bem humorada e instigante de lances. A presença de Marli e Julia, neste ato, serve como ponto de alteridade enquanto dão pistas dos rumos de suas vidas.
A contraposição dos três universos – de Beatriz, Marli e Julia – conduzem o espetáculo, mas as incursões de personagens masculinos rompem com esta linha e funcionam como elemento de desconstrução dos estereótipos que permeiam as trajetórias das personagens. Através deste recurso, o espetáculo insinua que “pode não ser exatamente assim” e incita o espectador a revisar conceitos.

O dinamismo da cultura popular



As manifestações folclóricas são muitas vezes tratadas como uma tradição estática, reproduzidas em datas específicas e que quase nunca sofrem alterações. Mas isso é só pra quem observa de longe. De perto, o folclore é dinâmico, mutante e capaz de se adaptar as transformações.
É o que acontece, por exemplo, com o fandango paranaense. Estudiosos afirmam sempre que o fandango preserva oa refrões fixos em cada uma das suas chamadas marcas, que podem ser  bailadas(dançadas) e batidas (sapateadas, usando tamancos de madeira)  e algumas valsadas.
Há registro de muitas marcas de Fandango, próprias para cada região em que é dançado.  Anu, Xarazinho, Xará-grande, Queromana, Tonta, Chamarrita, Andorinha, Cana-Verde, Caranguejo, Vilão-de-Fita, Lageana, Sabiá, Tatu, Porca e muitas  outras variando conforme a região.
Na região de Guaraqueçaba, no Paraná, o fandango é dançado sempre depois de um mutirão de trabalho, quando o dono da casa serve bebida e comida aos convidados que trabalharam o dia todo ou na colheita ou na capina ou ainda na construção de uma casa. Esta é uma tradição fixa, a do mutirão nas comunidades, seguido de comilança e baile. Mas a música e a sua letra, muitas vezes são atuais e geralmente mostram uma crítica social, como é o caso deste vídeo “Dinheiro do peixe morto”, feito pela Casa Mandicuera, um Ponto de Cultura de Paranaguá.

Misturinha boa de violão e piano


Murillo Da Rós e Gilson Peranzzetta no Paço da Liberdade
O título acima bem que poderia ser o tema de um chorinho. Mas da música que vou falar, de choro só tem o belo e espontâneo improviso de quando se misturam dois talentos, um virtuoso no violão e outro com dedos mágicos, libertinos descaradamente feliz em brincar com as teclas do piano, como deve ser toda a alegria de quem faz o que gosta. O resultado, para quem vê e ouve é indescritível. Falo do show de Murillo Da Rós (violão) e Gilson Peranzzetta, um mestre do piano, que aconteceu no Paço da Liberdade, em Curitiba, no dia 26 de janeiro.
O show, um reencontro entre Murillo e Gilson (eles tocaram juntos em abril do ano passado no Teatro Paiol), fez parte da programação da 30ª Oficina de Música de Curitiba, um evento que reúne grandes mestres da música brasileira, do erudito ao popular, passando pelo folclore, numa maratona que durou 20 dias.
Saí do Cristo Rei, distante uns 4 km do Paço da Liberdade, para uma caminhada até o local do show, com meia hora de antecedência. O frio e a garoa típica de Curitiba apressaram meus passos. Fui caminhando pela Pe. Germano Mayer até a XV, por onde desci até a praça Santos Andrade, seguindo para a Praça José Borges de Macedo, onde cheguei pontualmente seis horas da tarde, a tempo de entrar no belíssimo prédio da antiga prefeitura – que depois abrigou o Museu Paranaense – e ver o show. Cansado da caminhada, ainda tive o privilégio de entrar pelos fundos e fotografar as mitológicas mãos de Gilson Peranzzetta (explico porque mãos mitológicas em outro post e depois que conseguir autorização do músico, já que trata-se de uma história fantástica e quem me contou, sob olhares desconfiados de Peranzzetta, foi Murillo).
O violonista Murillo Da Rós
Nenhuma das músicas eram inéditas, já foram tocadas pelos dois e por Da Rós no lançamento do CD Fênix, mas a mistura da brasilidade e improvisos de Gilson e do vigoroso flamenco jazzístico de Murillo inovou as peças de forma transcendental. Para minha sorte – e a dos leitores deste blog,obviamente – é que o show foi inteiramente gravado em vídeo que devo postar em breve. Necessário será, inclusive, para que se tenha uma ideia do que foi o show sem os olhos empolgados do blogueiro.
Depois do show, tive uma longa conversa com Murillo, Gilson e a produtora Renata Zarpellon, mas isso também será assunto para uma nova postagem.
Não posso deixar de citar as excelentes performances do percussionista Luciano Madalozzo e do baixista Glauco Solter, que podem ser conferidas no vídeo abaixo.
VÍDEO